Luiz Eduardo Costa
Luiz Eduardo Costa, é jornalista, escritor, ambientalista, membro da Academia Sergipana de Letras e da Academia Maçônica de Letras e Ciências.
DO FEIJÃO DA VALE NA LAMA AO FEIJÃO DA CHINA NA LUA
01/02/2019
DO FEIJÃO DA VALE NA LAMA  AO FEIJÃO DA CHINA NA LUA

(ELE AINDA ESTÁ SOLTO)

Alguém já tentou imaginar o ambiente que estaríamos vivendo agora, no Brasil, caso a mineradora VALE ainda fosse estatal?

Mas é fácil fazer um sumário desenho do clima de indignação. Todas as redes de TV, da Globo à Record, os grandes jornais, as emissoras de rádio, além do noticiário da tragédia estariam produzindo longos editoriais, colhendo opiniões das pessoas nas ruas, e tudo convergindo para a denúncia do grande erro, do crime imperdoável de não ter sido privatizada a empresa, que, vítima da corrupção, da ingerência dos políticos, do peso da burocracia, perdera o bonde da modernização, e agora, sucateada, causava a hecatombe. Seria mais uma prova contundente e trágica da resiliente incompetência do Estado para administrar, e, mais ainda, a demonstração definitiva de que, reduzir o tamanho do Estado, é a mais urgente tarefa de um governante moderno, afinado plenamente com o conceito mais abrangente do liberalismo.

Todo debate nas sensíveis áreas da politica ou da economia, quando desanda para os extremos, conduz a narrativa a um insuperável impasse, aqueles becos sem saída das teorias inflexíveis aplicadas às realidades conflitantes.

O crime cometido pela Vale transcende o campo das ideologias, escapa dos debates acadêmicos, vai além da lógica do mercado, e se configura como uma afronta à dignidade de uma Nação, um desafio ultrajante às nossas leis, um acinte aos sentimentos de respeito ao próximo, e de solidariedade humana.

O governo não pode ficar limitado à penosa tarefa da contagem dos mortos, a fazer o cálculo dos prejuízos, e a cumprir o dever de socorrer os que restaram vivos. Todas essas providencias foram tomadas, e de forma rápida e eficiente.

Ao mesmo tempo, a justiça mineira saindo da sua inércia conivente, resolveu atender, finalmente agora, ao que pedia o Ministério Público, e a Vale até então impune, começa a anunciar providencias elementares, que há muito deveriam ter sido adotadas.

Ninguém poderá garantir que a empresa tenha, de repente, acoplado às suas práticas corporativas o senso de responsabilidade social que sempre lhe faltou.

Dai porque, alguma forma de intervenção terá de ser feita, sem que isso represente intromissão indevida na iniciativa privada.

Vivemos no meio de um tiroteio insano em que se transformou a narrativa política. O Brasil, com um desemprego em torno de doze por cento, com gravíssimos problemas a enfrentar, desperdiça tempo num debate virulento e inútil.

Episódios, decisões que seriam normais em outras circunstancias, se tornam o estopim para as explosões de odiosidades que envenenam o deteriorado cenário político. Nada ganhamos com isso. Pelo contrário, dissipam-se os esforços para o surgimento de um ambiente propício ao trabalho, e à busca de soluções.

Diante da enormidade da tragédia, diante do cenário de morte , dor, e espanto, surge a virulenta troca de acusações.

¨A culpa é do PT¨.

¨A culpa é de Bolsonaro¨.

Para um governo que apenas começa, é insensato atribuir culpas, como é inexata toda tentativa de encontrar responsabilidades setoriais, especificas. A Vale, é criminosa, não há duvidas, mas o seu crime foi partilhado por diversos governos, a começar por FHC, que fez uma privatização açodada, e cercada de suspeitas, por tanta liberalidades ao grupo comprador. A este grupo foi concedida a parte mais suculenta das reservas minerais do país, inclusive as estratégicas. A responsabilidade recai sobre a classe politica, o judiciário e uma legião variada de gente conivente No caso, o Ministério Público não ficou omisso, mas o judiciário mineiro fez pouco caso das denuncias.

A Vale tem um poderoso contingente de lobistas. O atual presidente Fábio Schvartzman foi indicado por ninguém menos do que o notório Aécio Neves, que ¨não dá prego sem estopa¨.

O saneamento da Vale, feito por pessoas não comprometidas com o cangaceirismo empresarial lá instalado, melhoraria a imagem da empresa, e criaria salvaguardas permanentes para que não se repitam as tragédias, nem prossiga a devastação gerada pelo modelo mafioso de gerência.

A possibilidade dessa ingerência ditada pelas circunstancias, esbarra na visão ultraliberal, onde o “deus mercado" se faz intocável, e seria ele o único a regular as decisões e a marcha da economia, inclusive, corrigindo sem interveniências externas todos os equívocos ocorridos no processo econômico, que é demasiadamente complexo para adquirir a capacidade de autoregulação.

O fato claro e evidente é que nenhuma das visões extremadas, tanto a ultraliberal, como a estatizante ou coletivista, se mostraram capazes de apresentar resultados satisfatórios do ponto de vista econômico e social.

Nenhum país subdesenvolvido saiu dessa situação e chegou a um elevado patamar de desenvolvimento equidoso, adotando integralmente, qualquer um dos dois modelos antagônicos.

Mas o meio termo de um modelo de economia privada ao lado do Estado indutor, e que planeja os grandes objetivos nacionais, tem dado resultados em países que eram muito pobres. Eles aparecem, na China, na Índia, na Coreia do Sul, no Vietnam, nos Emirados Árabes, e em alguns outros. O Brasil poderia ou poderá ser um deles, desde que não se contenha quando é preciso romper paradigmas.

Caiu o Muro de Berlim, quando o colapso econômico do socialismo modelo soviético exauriu sua capacidade para manter-se, sustentado num aparato totalitário.

A China escapou do desastre, e manteve o nome de fantasia para caracterizar a preponderância do partido único, o comunista, e adotou, de inicio, um modelo de capitalismo quase selvagem, que se foi aperfeiçoando, e transformou-se em um sucesso, sem similar no mundo.

A China, neste exato momento em que nós, brasileiros, lidamos com a lama mortífera escorrendo desde a barragem do Feijão, está plantando um pé de feijão no lado oculto da lua, onde, pela primeira vez, pousou um aparato vindo da terra, exatamente da China, que, ao mesmo tempo, lançou um revolucionário sistema que deixa obsoleta a internet, tal como agora funciona, e faz com que os atuais celulares sejam comparados à carroças, diante de uma Ferrari.

Há pouco mais de 50 anos, a China, com 700 milhões de habitantes, vivia sucessivas epidemias de fome que dizimavam milhões, era mais pobre do que o Brasil, e estava mergulhada na convulsão do extremado radicalismo ideológico.

Salvou-se a tempo e é agora a segunda maior economia do planeta.

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