Luiz Eduardo Costa
Luiz Eduardo Costa, é jornalista, escritor, ambientalista, membro da Academia Sergipana de Letras e da Academia Maçônica de Letras e Ciências.
TEXTOS ANTIVIRAIS (82)
02/12/2021
TEXTOS ANTIVIRAIS (82)

 

A RESPEITO DE GANÂNCIAS E HIPOCRISIAS

 

Rogério que se define como um "trator" ,dessa vez passou por cima da própria vergonha movido pela força de milhões de irresistíveis "argumentos".

 

Existe uma espécie de câncer que corrói a alma. Ao contrário do outro câncer que devasta e pode ser mortal,  mas é inevitável, o câncer da alma não mata, e pode   ser evitado, desde que exista uma vacina eficaz: o caráter de cada  cidadão. 

Há diversos tipos de cânceres impregnados na etérea essência humana: a desonestidade, o ódio, a hipocrisia, a falsidade, a ganância. Quando todos eles se reúnem em um só organismo, fazem do homo-sapiens o canalha absoluto.

Um político sergipano, no caso o senador Rogério Carvalho, se vai aproximando dessa classificação que desfaz a honra e identifica  o desonrado .

O senador chegou ao ápice da  carreira, alcançada com uma traição ao seu benfeitor maior que foi Marcelo Déda. No seu leito de morte, numa conversa presenciada por dois amigos, Déda fez um apelo a Rogério para que não  pleiteasse o cargo de presidente do PT sergipano. Alinhou alguns argumentos, entre os quais o mais sensível, que seria a sua imagem afetada por inúmeras suspeitas, o que  colocaria o partido  e também o próprio Rogério, numa situação ainda mais delicada, depois da enxurrada de acusações começando a surgir no panorama nacional. Sugeriu Déda, que o próximo dirigente petista, em Sergipe, teria de ser uma pessoa acima de qualquer suspeita, e até teria aventado a hipótese de dois ou três nomes. Rogério prometeu atender ao que poderia ser o último pedido do amigo e maior responsável pela sua ascensão rápida na vida pública;  garantiu ao enfermo terminal que, no regresso a Aracaju iria reunir-se com os companheiros, para, juntos, buscarem um nome que merecesse  o consenso.

Já em Aracaju, três dias depois, reuniu a militância e anunciou nada caridoso, sequer constrangido: “Meus companheiros, Déda já está no fim da vida, vamos cuidar da nossa”. E foi reforçando o seu discurso  de candidatíssimo.

Essas  são águas passadas, e ao que parece já diluídas pelo correr dos anos, onde os esquecimentos e as ingratidões se desfazem mais rápido de que a pátina do tempo  encobrindo a história.

Antes da renúncia total de Rogério à sua coerência política, mudando de convencimento por  uma chuvarada de cento e noventa milhões de sólidos e vistosos argumentos, o  petista Romulo Rodrigues, do qual se pode discordar politicamente, jamais, por nele enxergar um trânsfuga ou descuidado com a própria honra,   fez, na sua coluna  do JORNAL   DO DIA   e no Portal JL, algumas considerações sobre a atitude anterior de Rogério, ao romper bruscamente com o governador Belivaldo Chagas, seguindo o mesmo caminho que tomara antes em relação ao Prefeito Edvaldo Nogueira. Rômulo entendeu o ato como um gesto de política estudantil, tanto pela impropriedade, como pela ausência de comedimento e de elegância.  Apesar do significado desse substantivo feminino, elegância, andar nos últimos anos quase suprimido das atitudes e dos gestos políticos,  em nosso país.

Rômulo sugeriu a Rogério uma autocrítica, e alguma humildade, para desfazer o que classificou sem querer perder a elegância, de “ um profundo equivoco”.

Comentando o affair menos rocambolesco  do que o mais recente, que, quase sem  elegância  diríamos ser cafagéstico, o prescrutador  jornalista Jozailto Lima escreveu: “Rômulo Rodrigues não sabe se, nessa empreitada, terá sucesso junto ao petista meio gauche e que dispõe de uma das piores comunicações sociais entre os 11 sergipanos no Congresso Nacional. Mas ele garante que vai manter seu ponto de vista.”

Aquilo do que tratou Rômulo com tanta pertinência já é passado, e agora, andando tão rápido, o trator que  atropela a ética já vai muito adiante no seu rolar ganancioso.

Felipe II, rei da Macedônia, mestre do seu jovem filho, que a historia viria a  transformar em Alexandre o Grande, maior conquistador da antiguidade, sugeriu-lhe uma estratégia mais eficaz a ser incluída nas suas futuras “artes da guerra”:  “Um burro bem carregado de ouro põe abaixo a mais sólida das muralhas.”

Felipe, e nem mesmo o seu filho famoso chegaram a lidar com as “muralhas da hipocrisia”.

Se o fizessem, e fossem nossos contemporâneos,  viriam a saber, que, aquelas muralhas por trás da qual se escondem os moralistas em baby-doll, os hipócritas, são inimaginavelmente mais vulneráveis do que aquelas reais, protegendo cidades ou aquartelamentos.

Essas outras “muralhas” ou palavras tão falaciosas quanto incisivas, ditas ao vento,  necessitam, tão somente, de sutis argumentos que podem ser contados, digamos, assim: em cento e noventa milhões de vezes. Como diria o célebre e soturno  Dr. Goebel, arauto do sinistro Adolf Hitler, a mentira repetida mil vezes se torna verdade.

Alguns hipócritas, repetem, muito mais de mil vezes a farsesca mentira da defesa da moralidade pública. E não é que assim o Dr, Goebel confirma a sua cínica assertiva?  Há alguns deles, que, por algum tempo, se fazem acreditados pregoeiros da decência na vida pública.

Mas, na primeira oportunidade, e depois em milhares delas, vão confirmando o ensinamento de Felipe II,  aquele especialista em derrubar “muralhas”, sem maiores esforços e de forma incruenta, para não dizer irresistivelmente sedutora. Dizem que o ouro às vezes seduz mais do que o corpo ardente de uma mulher em brasa. 

Voltando ao senador Rogério,  depois dessas divagações: Ele se define como um “trator”. Tentando atrair, sem nenhum  sucesso, aliás, o dono de muitos votos Valmir de Francisquinho para ser o seu vice, Rogério disse-lhe que precisava de mais um “trator” para unir-se ao seu, e então, juntos, “tratorariam” Sergipe. Valmir desconfiou da proposta, e logo recebeu um telefonema do presidente Jair, convidando-o para ser o seu candidato ao Senado Federal. E ele parece que vai topar o desafio.

Mas, sem que ninguém imaginasse, o “trator” movido a  muitas ambições e infinitas ganancias chegou ao cúmulo da cafajestice.

Votou pela aprovação do orçamento secreto. O fez contra e em desobediência ao seu partido. O fez à revelia do seu candidato à presidência da República Luiz Inácio Lula da Silva. O fez,  mesmo sabendo que a soma de dinheiro à disposição de parlamentares do centrão e tantos outros ligados ao bolsonarismo, irá servir aos objetivos únicos e exclusivos da reeleição.

Agora, os petistas revoltados descobrem exatamente quem é o senador; os cidadãos brasileiros que o viram tão sôfrego e de dedo em riste defender a moralidade pública na CPI da Covid, já  enxergam exatamente o “trator” que ele representa. Pronto e azeitado para receber a carga “pesada” de cento e noventa milhões de bem acolhidos “argumentos.” E passar por cima da ética, da fidelidade aos princípios, do respeito aos próprios companheiros.

Aqueles cânceres da alma se mostram na maioria das vezes incuráveis.

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